Cuidado precoce de doenças em recém-nascidos garante bem-estar
Informação aos familiares e acompanhamento multidisciplinar contribui para a melhoria de vida das crianças com Fibrose Cística e Fenilcetonúria
Caroline Pires
A triagem neonatal é composta por exames realizados após o nascimento do bebê e um dos mais populares é o Teste do Pezinho, responsável por identificar doenças genéticas que, a longo prazo, podem interferir no desenvolvimento da criança. A Fibrose Cística e a Fenilcetonúria são diagnosticadas por esse exame. Duas pesquisas realizadas pela Faculdade de Enfermagem da UFG, sob orientação da professora Ana Karina Salge, investigaram os fatores que interferem na qualidade de vida das crianças atendidas pela Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae-Anápolis) e acometidas por essas doenças.
As pesquisas alertam para a necessidade de, ao receber o diagnóstico positivo, os cuidadores serem convocados para a missão de perseverar no tratamento e colaborar com a equipe multidisciplinar. Os resultados apontam que é fundamental esse acompanhamento para atender as crianças nos mais diversos aspectos que compõem a tarefa de oferecer a melhor qualidade de vida possível.
A orientadora das dissertações, professora Ana Karina Salge, da Faculdade de Enfermagem da UFG, reforça a necessidade de as mães serem informadas sobre o serviço de Triagem Neonatal que funciona bem no Sistema Único de Saúde (SUS). “O momento e o modo como o profissional de saúde repassa as informações sobre o exame para essas mulheres é muito importante, já que podem influenciar no aprendizado e compreensão dos dados transmitidos, fazendo com que as mães percebam a relevância do teste para prevenção de sequelas irreversíveis”, reforça a professora. Ela lembra ainda que em Goiás existe um serviço de referência, conhecido e respeitado internacionalmente, que realiza todas as análises laboratoriais dos testes coletados pelo SUS, que é a APAE em Anápolis. Esse serviço também fornece atendimento multiprofissional de qualidade para todas as famílias que possuem crianças com testes positivos.
Desafio da Fibrose Cística
Durante a pesquisa, Marcela Silvestre avaliou 39 prontuários de pacientes que foram diagnosticados com Fibrose Cística e receberam tratamento pela unidade da Apae. Destes, 32 estavam em acompanhamento e 7 vieram a óbito. Por meio de uma análise minuciosa do tratamento recebido e intercorrências durante a vida do paciente, o estudo colaborou para entender melhor a complexidade dos sintomas da doença. A pesquisa apontou que 21% dos pacientes foram hospitalizados em algum momento da vida, e que a terapia medicamentosa com suplemento vitamínico, enzimas e broncodilatadores são as opções mais utilizadas para tentar retardar o avanço da Fibrose Cística, que interfere principalmente no funcionamento dos sistemas digestório e respiratório.
Segundo ela, um dos indicativos apontados para a qualidade do tratamento é uma equipe formada por profissionais de várias áreas. “Entender a complexidades dos sintomas e a necessidade do trabalho conjunto de médicos, nutricionistas, enfermeiros e fisoterapeutas respiratórios é fundamental”, destacou. A pesquisadora destaca especialmente o papel da enfermagem nesse processo, tanto na orientação para os cuidadores da criança como no acompanhamento do desenvolvimento da doença.
A Fibrose Cística é uma mutação genética com mais de 1900 mutações do genes, e é divididas em seis classes, que apontam qual é o grau de comprometimento do paciente. Como os acometidos da doença não apresentam um quadro de sintomas padronizado, é possível que cada um tenha expectativas de vida e opções de tratamentos que devam ser traçadas de forma individualizada. Marcela ressalta o interesse em priorizar pesquisas futuras sobre a identificação dessas mutações, serviço que ainda não é oferecido pelo Sistema Único de Saúde, e que pode orientar de maneira mais adequada o atendimento das crianças com Fibrose Cística na Apae Anápolis.
Fenilcetonúria e o cuidado para toda a vida
Detectada também pelo teste do Pezinho, a Fenilcetonúria é uma doença rara que pode gerar diversas complicações no indivíduo, como o atraso no desenvolvimento ou dificuldade de aprendizagem, deficiência intelectual e convulsões. A doença é presente em indivíduos que não possuem uma enzima específica, a fenilalanina hidroxilase, e, apesar de haver diversos níveis da doença, inclusive as que são temporárias, o tratamento passa pela dieta restritiva de proteína.
A pesquisadora Vandressa Figueira destaca a relação entre o sucesso do tratamento com a equipe multidisciplinar e a atenção desprendida da família com a criança. Segundo ela, uma outra variável relevante encontrada na pesquisa se refere à escolaridade dos pais. “Os filhos daqueles com menos anos de estudo costumam ter maiores complicações. Além disso, foi identificado um abandono maior do tratamento na adolescência. Isso reforça a necessidade de os cuidadores e as crianças receberem informações adequadas ao longo dos anos”, frisou.
Em meio a todos os fatores, há boas notícias quanto ao sucesso obtido no tratamento daqueles pacientes fiéis às orientações recebidas, pois foi constatada a correspondência entre os cuidados recebidos e o desenvolvimento cognitivo normal. “Mesmo sendo uma doença crônica, para toda a vida, é possível ter um boa qualidade de vida”, reforçou Vandressa.
Persistir no tratamento
A professora Ana Karina destaca a importância da pesquisa acadêmica para a aplicação direta do conhecimento científico na sociedade e na melhoria da qualidade de vida das crianças e famílias. Os trabalhos apontam para a necessidade da atuação precisa de uma equipe multiprofissional, que consiga agir na prevenção, diagnóstico e tratamento, e também no estímulo à presença constante da família no suporte a criança. Esse suporte é fundamental para que ela não sofra futuramente com os desdobramentos da doença e tenha sua qualidade de vida garantida da melhor forma possível.
Os resultados das pesquisas foram apresentados para a Apae Anápolis com o objetivo de contribuir para que a instituição tenha uma visão cada vez mais apurada sobre os caminhos do tratamento percorrido pelos pacientes, que chegam ali logo nos primeiros dias de vida.
As pesquisadoras acreditam que as pesquisas, e os seus desdobramentos, poderão contribuir para a melhoria da qualidade do cuidado, já que os pontos de risco para abandono de tratamento foram identificados. “Como enfermeira reitero a importância do serviço de triagem neonatal no âmbito do SUS e a necessidade de educação da população sobre esse exame”, afirmou Vandressa Figueira.
Fonte: Jornal UFG
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